O tempo e o respeito

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Inezita Barroso. Algumas pessoas lhe criticavam publicamente. E outras que não tinha coragem de criticar sua figura passavam a atacar a produção do programa. E todos esses críticos sabiam que a última palavra sempre era dela. Inclusive de todos os nomes que vinham ou não no Viola, Minha Viola. Salvo por problemas técnicos do atual momento da TV Cultura que inviabilizavam gravações grandes, como orquestras ou grupos de outros estados.

Uma dessas agitadoras virtuais fazia e faz do seu pequeno círculo uma projeção de sua sociedade do espetáculo, um espécie de contrabando imaginário, pobre e fragmentado de sua própria mediocridade real. Cospe fogo. Como uma folgada crítica de plantão. Ela e todos esses são drãos. E dragões.

Em tempo, não tenho nenhuma sugestão para substituição de Inezita Barroso no Viola, Minha Viola, da TV Cultura. Ela é uma montanha gigantesca na história da música caipira. Não há ninguém à sua altura. A notinha da Folha de S.Paulo sobre Sérgio Reis e Lima Duarte é de uma ingenuidade infantil. Não tem fonte, não tem nenhum pronunciamento claro. Mais um produto do jornalismo medíocre que temos. E repercute sem limites.

A vida continua, mas o respeito à Inezita é gigantesco. O fato agora é que todas as gravações do programa estão suspensas. Vamos iniciar uma retrospectiva dos 35 anos do programa com as músicas e os convidados que construíram essa história ao lado da Dona Ignez. A força está na raiz. Não nos boatos.

Despeço-me desta grande artista

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Descanse com serenidade! Acabou de completar 90 anos e fechou um ciclo. Despeço-me desta grande artista, mestre e companheira de trabalho. Morre Inezita Barroso. Também morre um jeito de fazer música, um jeito de cantar, um campo vasto da arte brasileira. Morreu serena, tranquila, resistindo bravamente até o último minuto. Mas foi como um passarinho. Genial na música, ela mostrou ao Brasil também um jeito de envelhecer com dignidade e talento. Num país que se amplia na terceira idade, ela mantinha suas reinações. Gravou sua última participação no Viola, Minha Viola no começo de dezembro, aos 89 anos. Não conheço ninguém com história semelhante. A morte foi hoje. Mas de onde a vida surgiu, ela sempre esteve a postos. Obrigado por tudo, Inezita! Sempre!

Inezita Barroso, na linha do tempo

Linha do Tempo Inezita Barroso

(Compilação de dados da vida artística e pessoal da cantora e folclorista Inezita Barroso, elaborada por Aloisio Milani com base em documentos e no acervo pessoal)

1925
Nasce na Barra Funda, em São Paulo, num domingo de Carnaval. Segundo relato dos pais, Inezita nasce enquanto passava na rua do Cordão Camisa Verde.

1940
Participa das inaugurações do Estádio do Pacaembu.

1946
Formou-se em Biblioteconomia no pioneiro curso da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (USP).

1947
Casou-se com o advogado Adolfo Barroso, com quem teve uma filha, mas se separou alguns anos depois.

1951
Lançamento do filme “Ângela”, de Tom Payne e Abílio Pereira de Almeida, em que Inezita atua pela primeira vez no cinema.

1951
Grava seu primeiro 78 rpm não comercial (Gravadora Sinter) com “Funeral do Rei Nagô” (Hekel Tavares/Murilo Araújo) e “Curupira” 9Waldemar Henrique).

1952
Como cantora contratada, Inezita participa da inauguração da Rádio Nacional de São Paulo.

1953
Lança seu primeiro 78 rpm comercial (Gravadora RCA Victor) com “Moda de Pinga” (folclore paulista) e “Ronda” (Paulo Vanzolini)

1954
Protagoniza o filme “Mulher de Verdade”, dirigido por Alfredo Palácios. Ganha o Prêmio Saci de Cinema pelo trabalho.

1954
Estreia de “Vamos Falar de Brasil”, programa inovador de Inezita na TV Record, um dos poucos musicais exclusivos para as cantoras. Programa tinha repertório folclórico e popular, troca de figurinos, cenários diferentes para cada edição. E tudo ao vivo.

1958
Lança seu primeiro Long-play (LP). “Vamos falar de Brasil” (Gravadora Copacabana) traz músicas como “Lampião de Gás” (Zica Bérgami), “Engenho Novo” (Hekel Tavares), “Azulão” (Jayme Ovalle/Manuel bandeira)

1958
Lança o segundo LP, um formato inédito no qual Inezita traz cinco mulheres compositoras e estreantes. “Inezita Apresenta – Babi de Oliveira, Juracy Silveira, Zica Bergami, Leyde Olivé, Edvina de Andrade” (Gravadora Copacabana) é sucesso de crítica.

1962
Lança o LP “Clássicos da Música Caipira” (Gravadora Copacabana) com uma primeira seleção do repertório que marcaria sua carreira na música raiz.

1972
Lançamento do LP “Clássicos da Música Caipira – Volume 2” (Gravadora Copacabana).

1980
Primeira aparição no Viola, Minha Viola, programa concebido por Eduardo Moreira e apresentado por Moraes Sarmento e Nonô Basílio.

1980
Após saída de Nonô Basílio, Inezita assume a apresentação do programa o lado de Moraes Sarmento.

1987
Estreia o programa “Mutirão”, na Rádio USP, no qual dirigiu e apresentou artistas da música raiz por nove anos.

1990
Estreia o programa “Estrela da Manhã”, na Rádio Cultural, a convite da então gerente Maria Luiza Kfouri. Fica por nove anos no ar como a “porta-voz” no rádio de dezenas de duplas caipiras do país.

1997
Torna-se a única apresentadora do Viola, Minha Viola, da TV Cultura.

2004
Recebe a medalha da Ordem do Mérito Cultural por sua obra na música.

2005
Recebe a Medalha Inconfidência pela sua obra.

2005
Título de doutora honoris causa pela Unicapital (SP), onde lecionou folclore.

2005
Comemorações de 25 anos do Viola, Minha Viola e dos 80 anos de vida na Sala São Paulo.

2009
Recebe a medalha Ordem Ipiranga pela sua obra artística.

2010
Comanda a comemoração dos 30 anos do Viola, Minha Viola no Auditório Ibirapuera.

2013
Recebe o Prêmio Governador de São Paulo na categoria música.

2014
Lançamento do primeiro DVD comercial da carreira: “Inezita Barroso – Cabocla Eu Sou”, gravado ao vivo no Teatro Franco Zampari.

2014
Foi eleita para a Academia Paulista de Letras em substituição à folclorista Ruth Guimarães.

2015
Faleceu dias após completar 90 anos. Foram quase 70 anos de carreira em cerca de 100 discos lançados. Deixou uma filha, três netas e cinco bisnetos.