Mais da revolução de São Domingos

Estão na lista dos mais lidos do blog Left ~ Write, de Aniket Alam, três posts (1, 2, 3) sobre a Revolução de São Domingos, o fato histórico que culminou com a independência do Haiti. Escrevi também sobre isso para a História Viva, baseado na análise de C.L.R. James, em “Os Jacobinos Negros” (The Black Jacobins), publicado no Brasil pela editora Boitempo.

Vale a pena ver como o assunto anda viajando pela net. No primeiro post, o autor usa como epígrafes os versos de “Redemption Song”, do Bob Marley, a descrição do tráfico negreiro. No século 16, o comércio de escravos tinha no Haiti o seu principal alvo lucrativo para a burguesia francesa. A independência começou justamente pela revolta dos negros.

O que Peter Hallward disse…

Dando continuidade à série de intelectuais que refletem sobre a situação atual do Haiti, publico algumas idéias de Peter Hallward, professor de filosofia da Universidade de Middlesex. Foi um dos primeiros a de debruçar sobre a recente crise haitiana ao escrever o artigo “Option Zero” para a revista New Left Review.

Escreveu no ano passado o livro “Damming the Flood: Haiti, Aristide and the Politics of Containment”. É o escritor que faz parte das fontes de informação de Noam Chomsky. A seguir, alguns trechos de um artigo que ele publicou no Znet Haiti Watch, em dezembro.

No curto prazo, é difícil negar que a remoção forçada do governo de Aristide, em fevereiro de 2004, foi provavelmente o sucesso mais espetacular de uma administração dos Estados Unidos. O longo esforço de contenção, descrédito e, em seguida, derrubada do Lavalas nos primeiros anos do século 21, constitui o maior êxito do exercício neo-imperial de sabotagem desde a derrubada da Nicarágua Sandinista em 1990.

Em muitos aspectos, foi muito mais bem sucedida, pelo menos no curto prazo, do que triunfos imperialis anteriores no Iraque (2003), Panamá (1989), Granada (1983), Chile (1973), o Congo (1960), Guatemala (1954) ou o Irã (1953)… Não só o golpe de 2004 derrubou um dos mais populares governos na América Latina, mas ele conseguiu derrubá-lo de uma forma que não foi amplamente criticada ou mesmo reconhecida como um golpe para todos.

No longo prazo, porém, a situação é menos clara. Quando o venezuelano Hugo Chávez visitou Porto Príncipe em março de 2007, foi cumprimentado por milhares de pessoas. Naquele dia, o slogan nas ruas foi “Viva Chávez, Viva Aristide, aba Bush!” Se Aristide for autorizado a regressar ao Haiti, admite um ministro do governo atual, é mais do que provável que milhares de pessoas irão dar-lhe as boas-vindas. (…)

Aristide irá certamente continuar a ser o mais popular e mais influente homem no país, e ele retornará com o seu compromisso de transformação política não-violenta. Quando ele retornar, por outro lado, ele não será mais preso pelas limitações da diplomacia e dependência econômica que foram moldadas poderosamente nos seus últimos anos no poder. Talvez não seja por acaso que os defensores do status quo do Haiti ainda estão aterrorizados pela perspectiva deste retorno, e continuam determinados a impedi-lo a todo o custo.

Fotos do carnaval no Haiti

Essa época é muito boa para conhecer a cultura do Haiti. É época de carnaval e, assim como no Brasil, há vários blocos na rua, com desfiles e bandas com marchinhas. Em 2004, numa de minhas viagens para lá, conheci a casa de um fabricante de bonecos em Delmas. Lembrou-me Olinda.

Deixo algumas fotos recentes que encontrei pela net. Achei uma boa galeria no Flickr sobre 2007 do fotógrafo Darre-Ell, que esteve por lá.

Reuters

Desaparecido no Haiti há mais de cinco meses

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Foi notícia no Haitianalysis.com o crescimento de apoio internacional para a busca de notícias do ativista haitiano dos direitos humanos, Lovinsky Pierre-Antoine, seqüestrado em agosto de 2007. Há uma petição de apoio à iniciativa na internet e também uma recente nota da Anistia Internacional sobre o assunto. Ele trabalhava com vítimas dos golpes de Estado, como considerava os eventos em 1991 e 2004 que derrubaram Jean Bertrand Aristide. Era um crítico da ação internacional e das forças da ONU. Aqui segue um link com uma entrevista sua em inglês antes da ação das tropas em Cité Soleil.

Primeira ciranda de textos sobre jornalismo

O André Deak, antes de passar uma temporada em Cuba, coordenou o primeiro blog carnival de jornalismo online no Brasil. A idéia foi a seguinte: blogueiros publicaram textos sobre jornalismo na rede e os artigos foram organizados em um blog, como um guia de leitura.

“A idéia, jogada na lista de discussão do Jornalistas da Web, era repetir o modelo do blogs carnivals: vários blogueiros se juntam e publicam textos sobre um determinado tema no mesmo dia. Um deles publica uma coleção com os links de quem escreveu, e assim por diante, mudando apenas o blog que hospeda o guia de leitura”, explica Deak.

Quantos semáforos há em Roma?

O trânsito de Porto Príncipe, no Haiti, é realmente caótico. Já demorei mais de 2 horas para fazer um trecho de três quilômetros. Mas o engraçado é como isso, para alguns, serve de indicador de pobreza. É verdade… falo sério!

Li hoje um texto do site Zenit que falava sobre o balanço da organização internacional Ajuda à Igreja que Sofre (AIS). Para citar um exemplo de pobreza e necessidade, Xavier Legorreta elencou que em toda sua viagem viu apenas quatro semáforos funcionando no Haiti.

Voltei ao topo da página e li um slogan do site Zenit: “O mundo visto de Roma”, certamente em alusão à sede do Vaticano. Aí me perguntei: Quantos semáforos há em Roma?

Talvez eles possam doar faróis para o Haiti, mas podem ter certeza que não vão ajudar um milímetro na situação do povo pobre caribenho. Talvez da elite haitiana, que deve enxergar a coisa por este mesmo ângulo.

Aqui embaixo deixo a foto do colega Spensy Pimentel com uma rua de Cité Soleil.

Spensy Pimentel/ABr

“Os destinos mais perigosos do mundo”

Muitas pessoas têm mania de listas. Minha amiga Carol Costa é uma delas. Mas a Forbes é viciada nisso: ordenação, ranking, listagens mil. De preferência com numerais cheios: 10, 50, 100! Eu, sinceramente, fico com um pé atrás quando as metodologias para chegar a estas listas não são detalhadamente explicadas nas reportagens.

Aqui um caso desses. O texto de Rebeca Ruiz para a Forbes se propõe a listar os destinos mais perigosos do mundo. Fiquei pensando que Colniza, no Mato Grosso, deve ser mais perigoso do que todos esses lugares. Mas continuei lendo. E o Haiti estava lá no meio. Segundo o texto, por causa da corrupção na polícia e do narcotráfico.

E junto dele estariam a Palestina, Iraque, Líbano, Congo e Sudão. Será o Haiti está ao lado desses? Pelo menos para o Departamento de Estado dos Estados Unidos, sim. Foi emitido por ele recentemente um alerta para viagens ao Haiti por conta da segurança, principalmente por perigo de seqüestros.

Imigração: de pobre para menos pobre

Desde quando assisti o trailer de “The Price of Sugar”, fiquei intrigado com a problema crescente da imigração haitiana para a República Dominicana. Uma troca de lugares, mas com pobrezas similares. Isso porque os haitianos geralmente migram sem documentos e dispostos a ganhar qualquer dinheiro ou comida no trabalho da agricultura.

Recebi agora via RSS uma reportagem do NYTimes que O Estado de S.Paulo traduziu sobre esse mesmo problema. Deixo abaixo um trecho, fotos e os links para o texto original, o traduzido para o português e o audio slide show. A apuração foi feita por Jason DeParle sob o título original de “A Global Trek to Poor Nations, From Poorer One”.

NYTimes

Os barracos de madeira numa encosta lamacenta são uma versão da terra prometida para o homem pobre. Têm o teto cheio de goteiras e chão de terra, não dispõem de luz elétrica nem água encanada, mas centenas de haitianos arriscam a vida para vir para cá e trabalhar nos campos próximos. Eles fazem parte de uma tendência global – habitantes de países paupérrimos que se mudam para países pobres.

Entre eles está Anes Moises, de 45 anos, um homem de pele escura com alguns cabelos brancos que trabalha em plantações de banana na República Dominicana há mais de uma década , sempre ilegalmente. Os fazendeiros pagam a ele US$ 5 por dia e lhe dizem que os haitianos não prestam. Os soldados o chamam de “diabo” e já o deportaram quatro vezes.

Mas com um rendimento médio na República Dominicana seis vezes maior que no Haiti, Moises respondeu a cada expulsão contratando um contrabandista para subornar os guardas da fronteira e levá-lo de volta. “Somos obrigados a voltar para cá. Não porque gostamos, mas porque somos pobres”, disse ele. “Quando cruzamos a fronteira, nossa vida melhora um pouco, pois conseguimos comprar sapatos e talvez um frango.”

Pelo cancelamento da dívida do Haiti

O ZNet reproduziu um bom artigo de Joe Emersberger and Jeb Sprague, para o Haitianalysis.com, sobre a dívida do Haiti. Os autores mostram o debate sobre o cancelamento total da dívida haitiana como alternativa para o desenvolvimento. E citam um estudo da CEPR sobre o assunto.

O país provavelmente não atingirá as condições necessárias para entrar no programa do FMI de países altamente envididados até setembro de 2008. O que tratá mais custos para o país, cerca de US$ 49 milhões, ou melhor, 26% de tudo o que o país gasta com saúde pública atualmente.

O argumento do cancelado é bem parecido com o que entidades brasileiras defendem, como é o caso da Rede Brasil em conjunto com a Jubileu Sul – quem me explicou isso foi a coordenadora Fabrina Furtado na reportagem que fiz para a Rolling Stone, no ano passado.

O longo caminho de saída da missão de paz

O chefe da missão de paz da ONU no Haiti, o tunisiano Hédi Annabi, esteve no Brasil esta semana para discutir os desafios da ação internacional no país mais pobre das Américas. Com ele estão as chaves para descobrir quais podem ser as possíveis alterações na missão e seu planejamento de saída do país. Este último, sinceramente, nunca houve. Publicamente, sempre se adiou essa discussão, ano após ano. Mesmo após a vitória do presidente René Préval.

José Cruz/ABr

Pelas falas registradas pela imprensa durante uma conferência em Brasília, não houve novidades nesse planejamento (ou na sua ausência). Há a intenção se ampliar a participação de policiais civis, continuar o treinamento da Polícia Nacional do Haiti (ainda despreparada, violenta e corrupta), fiscalizar as fronterias e manter o efetivo militar por cerca de cinco anos mais. Novamente se registrou a urgência da reforma do judiciário, mas sem nenhum indicador claro.

Leia reportagens do NYTimes e da Agência Brasil.

Haiti, um grande entreposto comercial?

Sempre me pergunto qual será o futuro do Haiti – esse país miserável, com florestas e agricultura devastadas, sem petróleo ou minérios. Será que o modelo de desenvolvimento passa por maquiladoras, zonas francas de produção com exploração da mão-de-obra? Será um território cuja produção é controlada por multinacionais? Ou manterá um nível de corrupção e tirania por ciclos viciosos?

Hoje, li uma notícia do USA Today que me alertou para uma pista, que há tempos venho farejando. O Haiti pode ser, como a República Dominicana e a Jamaica são, um grande entreposto comercial. Uma região portuária internacional de baixos custos. Seu litoral possui águas profundas para a navegação de grandes embarcações, que passem ou não pelo Canal do Panamá. A “estabilidade” do Haiti interessaria a muitos países.

É com essa idéia na cabeça que li as declarações do presidente René Preval durante discurso anual no Congresso. “O Haiti deve reformar o seu sistema aduaneiro cheio de corrupção e incentivar os investimentos para retirar o conturbado país do Caribe da pobreza”. Segundo ele, os impostos sobre o transporte marítimo de containers de 40 pés chegam a US$ 900, ou seja, três vezes mais do que na vizinha República Dominicana.

O que Préval e a reportagem não explicam é: aumentar o fluxo garante riqueza para o país? Esse dinheiro vai ser dividido como? Sem respostas assim, a proposta pode servir como uma luva ao “fluxo de caixa” das grandes empresas e abrir mais um ralo de exploração dos haitianos.

O Haiti Innovation também puxou a matéria com um comentário que pede mais transparência no combate à corrupção e com apoio à proposta. Será que é o caminho? 

A caveira mostra a cara…

Há tempos tenho lido e ouvido argumentos que apontam um desejo velado de acionar as forças especiais das policiais militares e até Forças Armadas para combater o narcotráfico e a violência urbana. Quanto ao objetivo da garantia da ordem não faço objeções. Minha discussão é quanto aos métodos.

O Estado, por conceito, não pode agir com base no terrorismo, na chantagem, no autoritarismo e na violação das regras democráticas que o legitimam. Mas a ação e a reação à violência, na maioria das vezes, vem carregada desses ingredientes. Foi assim que Tropa de Elite fez sucesso. Mas há tempos eu não via uma declaração tão clara desse pensamento como a entrevista do coronel Emir Laranjeira no blog Santa Bárbara e Rebouças. Vejam o naipe:

o caminho é o enfrentamento sistemático e com o uso de força superior à dos bandidos até a erradicação dos narcoguerrilheiros favelados. É claro que isto não erradicará o tráfico, mas pelo menos o tornará passível de coerção policial. Hoje o aparato policial estadual apenas engarrafa fumaça ou enxuga gelo em relação ao tráfico…

Venezuela contra Haiti… no futebol

Na preparação para as eliminatórias da Copa do Mundo, a Venezuela marcou dois amistosos em seu país contra o time do Haiti. O primeiro no Estadio Monumental de Maturín, no dia 3 de fevereiro, e o segundo em José Antonio Anzoátegui de Puerto La Cruz no dia 6. A notícia foi confirmada pela Federação Venezuelana de Futebol. Segue o calendário da primeira fase da Concaf. O Haiti só entra na segunda fase. O resultado você confere com exclusividade aqui no blog, porque acho que nenhum outro veículo vai cobrir.

Revolução negra, a independência do Haiti

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Também saiu publicada hoje uma reportagem que fiz sobre a independência do Haiti para a revista História Viva. Chama-se “Revolução negra” e conta como foram as revoltas dos escravos a partir de 1791 sob a influência da Revolução Francesa. Li um monte de livros sobre o assunto, mas a principal referência é “Jacobinos negros”, de Cyril Lionel Robert James. A íntegra do texto está na página da História Viva, abaixo o abre da matéria:

O trabalho na cana era extenuante e desumano. Por décadas, a colônia francesa de São Domingos sustentou um dos mais lucrativos negócios do Novo Mundo com o chicote apontado para o corpo dos escravos africanos. Os negros cavavam valas para o plantio das mudas, cuidavam dos brotos, zelavam pelo crescimento, faziam a colheita e toda a fabricação do açúcar.

Os lucros dependiam da exploração do trabalho. A manutenção da escravidão pelos donos de engenho se baseava em castigos brutais e tinha um nível de perseguição implacável. Os relatos da época descreviam que as punições das chibatas eram mais comuns do que receber comida. Mutilavam-lhes membros, orelhas e genitais; faziam-nos comer excrementos; amarravam-lhes grilhões e blocos de madeira; prendiam-nos a postes fincados no chão.

A tortura sistemática originava, não sem razão, uma sede de vingança. E este foi um dos motivos da revolta que seria iniciada em 1791 e conformou a única rebelião vitoriosa de escravos desde a Antigüidade clássica. A independência do Haiti, proclamada em 1804, só nasceu por causa dela.

A revista também fez na edição online e impressa uma citação ao documentário Bon Bagay Haiti, como parte das pesquisas atuais sobre o país mais pobre das Américas.

Sete crises políticas da era Lula

Chegou hoje às bancas (pelo menos aqui em São Paulo) a edição de janeiro da revista Rolling Stone. Na edição passada, como anotei aqui, tinha feito uma reportagem sobre a má gestão de recursos públicos no país. A capa era a da Rita Lee. Agora, a capa é da Alessandra Ambrósio, uma modelo lindíssima que eu, sinceramente, desconhecia. Mas não escrevo para falar dela…

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Deixo aqui a indicação para a leitura de um artigo que escrevi com uma retrospectiva das crises políticas da era Lula. No site deles há apenas dois parágrafos, mas deixo a indicação para quem quiser ler. Ah… o André Deak fez um texto também sobre a relação do governo Lula com a América Latina.