Haiti e a roleta da crise financeira

Sinceramente, não tenho idéia qual é o tamanho do mercado de ações no Haiti. Nem tenho a mínima idéia do tamanho do impacto da tensão nas bolsas dos últimos dias nos leilões das ações das empresas de capital aberto por lá. O que quero aqui é lançar um desafio sobre como o mundo especulativo do mercado financeiro é contraditório com a vida de populações pobres. Alguém aí tem a medida ou a noção de quanto significa US$ 700 bilhões do pacote anticrise de Bush?

A quantia é quase o total de toda a produção de riquezas do Brasil durante seis meses. Isso para aliviar a gestão de empresas que venderam crédito a torto e a direito, e que, logicamente, fizeram a economia dos Estados Unidos como refém neste momento. Porque a falências das empresas levará junto a superpotência, não tenham dúvida. Mas a comparação que merece ser feita é entre o pacote anticrise dos Estados Unidos e a dívida externa haitiana.

O Haiti, um país pobre cujo endividamento começou de maneira moralmente indefensável pela ex-metrópole França, que queria indenização pelos escravos perdidos na independência. A dívida externa é de US$ 1,6 bilhões, pouco diante do pacote de Bush mas que impõe um ajuste fiscal brutal sobre o já baixo orçamento público comprometido com o pagamento de juros, que não param de crescer.

A Papda lançou novo apelo contra essa contradição após a devastação dos furacões – tragédia humanamente pior do que a das bolsas. Só com o pagamento dos serviçõs da dívida, estimados entre US$ 60 ou US$ 80 milhões anuais, daria para aliviar a situação das vítimas e ajudar na reconstrução do país. O governo haitiano mantém o pagamento dos juros e libera proporcionamente seis vezes menos dinheiro para a reconstrução do país.

Quem tem medo de uma moratória? E por que os credores não perdoam as dívidas como forma de ajudar a economia haitiana? O que vale mais agora: ajuda vidas ou manter os juros? Sobre isso há um imenso silêncio dos governos…