Esperança nas tempestades?

A BZ Films fez o vídeo “Haitian Hope” em conjunto com a ONG Parterns In Health para mostrar a situação do país caribenho após os quatro furacões. A trilha deixou em mim a impressão de que o material foi editado para incentivar o derretimento de corações, mesmo que as imagens falassem por si. Mas vale a pena…

Caos dos furacões no Haiti – update de fotos


Agora, passado algum tempo após os quatro furacões que atormentaram o Haiti, chovem na internet atualizações das fotografias da tragédia. Para ser mais exato, das quase 800 mortes e outras dezenas de milhares de desabrigados. Via Haiti Innovation, recebo alguns links para navegar pela dimensão de ser pobre num país que está na rota dos furacões. A foto acima é da equipe da Rádio Nederland. Também tem a própria galeria do blog Haiti Innovation. Na Federação Internacional da Cruz Vermelha, uma galeria mostra Gonaives alagada. A Cruz Vermelha dos Estados Unidos traz mais 20 fotos. Também no Flickr, imagens do comando militar dos Estados Unidos entregando a ajuda humanitária. Susan Walsh publicou fotografias de resgates em Gonaives. Complemento a apuração deles com links importantes da página da Minustah, do Haitian Times, do TNT Emergency Response Team, além do sempre impressionante olhar da fotógrafa Ariana Cubillos, do Washington Post, como na foto abaixo.

Ajuda pós-furacões e economia haitiana na berlinda

A passagem dos furacões pelo Haiti (e seus impactos) foram pouco noticiadas no Brasil. Há alguns dias, jornalistas da TV Globo, da EBC e da Agência Lusa foram para lá. Esta última, inclusive, com belas reportagens. No balanço, deram matérias em português com relatos dos soldados e dos representantes da ONU sobre a ajuda humanitária. O general Santos Cruz estima em quase 17 mil os desabrigados. A diretora do Programa Mundial de Alimentos, Josette Sheeran, acredita que nem um terço das doações necessárias chegaram. De Porto Príncipe, o embaixador brasileiro comenta que alimentos são doados pelo Brasil diretamente a famílias e entidades necessitadas. Enviado da ONU clama por doações via governo e não por ONGs. Na imprensa estrangeira, há denúncia de roubo de alimentos que seriam entregues para as vítimas. O Unicef reafirma que as crianças são as principais vítimas. ONG Médicos Sem Fronteiras atua fortemente em Gonaives. Venezuela anuncia plano de ajuda ao Haiti por intermédio da Petrocaribe, já uma reportagem da NPR vincula a atuação de Chávez a uma manobra política na região. No rastro dos quatro furacões que devastaram o país, outra tempestade se forma – o impacto financeiro que a crise dos Estados Unidos pode provocar no Haiti. O economista Kesner Pharel alerta que a economia haitiana é muito vulnerável. Já frágil por ser grande importador de alimentos, os efeitos de uma recessão no país podem ser bem duros. E empurrar cada vez mais gente para imigrações ilegais. Sem que ninguém discuta uma “ajuda econômica” ao Haiti diante da enxurrada de dinheiro que seguirá para a roleta das bolsas. E se o furacão recessivo for uma tormenta a conta-gotas?

Ajuda internacional e o destino do dinheiro

Enquanto tenta ajudar desabrigados e contar seus mortos por quatro tempestades tropicais, o Haiti também discute sobre o destino do que ajuda para prevenir novas tragédias. Na temporada de furacões, um novo temporal pode chegar a qualquer momento. Então, além de discutir a ajuda humanitária com medicamentos, comida e água, o país precisa começar a pensar como usar possíveis doações internacionais que estão prometidas dos Estados Unidos, Espanha, Brasil e outros países.

Um exemplo… a cidade mais atingida pelos furacões, Gonaives está localizada no norte do país numa área costeira que tem até um nível pouco abaixo do mar. Nas encostas das montanhas que circundam a cidade, quase toda a vegetação foi desmatada para a produção de lenha. A água barrenta então desce e se liga ao mar. Ajudar a resolver a vulnerabilidade do Haiti a furacões é planejar também investimentos por reflorestamento, diques e saneamento básico.

No HaitiAnalysis.com, um editorial escrito por Wadner Pierre que cobra o destino do dinheiro internacional que chegou ao governo provisório após a passagem do furacão Jeanne, em 2004, quando mais de 3 mil pessoas morreram só em Goinaives. A seguir um trecho:

O furacão Jeanne devastou o Haiti em 2004 oito meses após o golpe que derrubou Jean-Bertrand Aristide. Gerard Latortue [o primeiro ministro do governo provisório], o cabeça da ditadura da ONU e natural de Gonaives, recebeu dinheiro de todo o mundo para ajudar a reconstruir a cidade. Infelizmente, as vítimas receberam poucos benefícios deste dinheiro. Gonaives situa-se abaixo do nível do mar, mas diques nunca foram construídos; muitas estradas ainda sequer foram reparadas. Os poucos resultados obtidos com dinheiro da ajuda internacional só traz a convicção de que, em Gonaives, os amigos de Latortue e ONG’s corruptas simplesmente embolsaram o dinheiro. (…)

O presidente René Préval, um nativo do estado de Artibonite [onde Gonaives é a capital], apelou à comunidade internacional para ajudar. The uproar over his latest nomination for Prime Minister has ended. O tumulto sobre sua última indicação para primeiro-ministro terminou. O Senado aprovou Michele Duvivier Pierre-Louis como primeiro-ministra. Auxílio dinheiro vai chegar. A questão é que irá se beneficiar com ele. O povo de Gonaives está compreensivelmente pessimista após a experiência com o furacão Jeanne.

Imagem da tragédia em Gonaives

Não é fácil entender o tamanho da tragédia de um furacão no Haiti se você nunca foi até lá para saber que tudo dificulta o povo. Não há habitação decente, saneamento básico, sistema de drenagem de água, atendimento médico ou qualquer “facilidade”, melhor chamada por qualquer um de “direitos”. À medida que a água baixa após a passagem dos furacões Hanna e Ike, Gonaives descobre seus mortos. Hoje, há na página oficial da Minustah uma foto horrível, merecedora de qualquer prêmio de fotojornalismo que fale sobre o Haiti. Não pelo mérito estético, mas pela evidência do desastre. O corpo de uma vítima, em estado de decomposição, é encontrado na lama. O slideshow inteiro pode ser visto aqui.